sexta-feira, 1 de maio de 2015

Anarquista preso em Lisboa

“Saúde companheir@s

Gostaria que publicassem esta carta de um companheiro preso em Lisboa. Não pode fazê-lo ele mesmo porque está isolado e sem acesso à internet.

Saudações.

Diego C.”

Olá a todos e a todas

Chamo-me Jaime Giménez Arbe, ainda que alguns/as talvez conheçam melhor o sobrenome que me deu a Guarda Civil e os meios de desinformação do Estado: “El Solitario”.

Estou preso na prisão de Monsanto, em Lisboa, Portugal, desde Julho de 2007. Esta prisão tem sido denunciada em inúmeras ocasiões como sendo a “Guantánamo de Portugal” pelas suas condições de vida e maltratos continuados sem paralelo na Europa.

Sou, com dois companheiros, o preso que está há mais tempo nesta masmorra imunda e sem nenhuma possibilidade de ser transferido para outra prisão portuguesa de regime normal, se por normal se pode entender o sistema de prisões de Portugal que é puramente terceiro-mundista.

Fizeram-me saber, oficialmente, que eu estaria nesta prisão de Monsanto até que fosse transferido para Espanha e que existia uma pressão por parte da polícia espanhola para que me mantivesse aqui o maior tempo possível.

Em 2010 solicitei, com base no tratado bilateral existente entre a Europa e Portugal, assim como numa resolução executiva da União Europeia, a minha transferência para Espanha para acabar de cumprir a minha aberrante e injusta condenação imposta por esta justiça das bananas de Portugal.

A fim de que não pudesse ser transferido, foram sendo instruídos “oportunamente” uma série de processos judiciais em Portugal, que em Espanha não passariam de acusações de faltas ou que talvez nem constituíssem qualquer delito. Tudo para inviabilizar a minha transferência para Espanha.

Paralelamente, e sempre que pareceu conveniente a essa justiça inquisitorial espanhola, levaram-me para Espanha temporariamente para me submeterem a acusações-farsa de que sempre e invariavelmente saio condenado sem que haja qualquer prova, digna desse nome, contra mim. Para isso utilizam uns denominados “mandatos europeus”, a que não te podes opor.

De modo que por casualidade, “casualmente”, fui trasladado para Espanha em 6 ocasiões diferentes, por um tempo total acumulado de quase dois anos. Durante este tempo estive em prisões espanholas em isolamento e nas piores condições possíveis. Mas, é claro, vindo de uma prisão como Monsanto qualquer cárcere espanhol é quase como um “resort” de férias.

O repugnante é que com as absurdas leis portuguesas em vigor, durante todo o tempo em que estive preso em Espanha, vítima de outros mandatos europeus de detenção, o cumprimento da sentença em Portugal foi suspenso, aumentando ainda mais a minha condenação neste país.

Por fim, em Junho de 2014, concretamente no dia 16, o Procurador Geral da República de Portugal mandou um ofício ao Ministério da Justiça Espanhol, concretamente ao Gabinete de Cooperação Jurídica Internacional, informando de que, por fim, se podia proceder à minha transferência definitiva para Espanha para “acabar de cumprir” a minha pena neste país.

Antes de prosseguir, quero explicar-vos que relativamente à lei espanhola a minha condenação em Portugal já se extinguiu há vários anos e que Espanha, depois de ser transferido, tem total autoridade de aplicar e, se for o caso corrigir, os desvarios, aberrações e injustiças da justiça portuguesa; uma vez que os delitos têm que ser homólogos, ou seja, que existam enquanto tal na legislação espanhola e que as penas pelos mesmos não excedam em tempo o estabelecido pela lei espanhola. Para dar um exemplo, por roubar um pacote de caramelos ninguém em Espanha pode ser condenado a passar 5 anos da sua vida na prisão, como sucede de facto em Portugal.

Mas continuando com o que estava a expor, quero dizer-vos que o Gabinete de Cooperação Jurídica Internacional acusou a recepção da petição da procuradoria-geral da república portuguesa no dia 30 (Junho) de 2014. E desde então não se fez absolutamente nada. Nada de nada. Em Novembro, por fim, e porque Portugal face à falta de resposta do Ministério da justiça espanhola, voltou a enviar outro oficio requerendo uma resposta da autoridade espanhola, que por fim respondeu. Neste momento, o meu advogado espanhol e a minha família tentaram por-se em contacto com a o Gabinete de Cooperação Jurídica Internacional do Ministério da Justiça espanhol, situado na c/Bernardo, de Madrid. Em concreto, pretendia encontrar-se com a Directora Geral desse organismo, para pedir respostas e soluções. A dita senhora, obviamente uma funcionária política desse lacrau chamado Partido Popular, negou-se totalmente a receber em audiência o meu advogado ou simplesmente a falar com ele ao telefone, delegando num subalterno, que obviamente não tem poder de decisão e que obedece a ordens. A verdade é que até este momento o Gabinete de Cooperação Jurídica Internacional do Ministério da Justiça limitou-se a solicitar documentos e mais documentos, que são redundantes, pois Portugal já os enviou noutra altura. Portanto, falando de forma coloquial, o que fazem é empatar para que eu não seja enviado para Espanha.

Quero que as pessoas que leiam isto saibam que, normalmente, noutros casos, estes “trâmites” levam dois meses no máximo, nunca 8 meses ou inclusive muito mais, como é o meu caso. Inclusivamente indivíduos com Ángel Carromero, das Novas Gerações do PP, trouxeram-no de Cuba onde estava condenado por homicídio devido a imprudência grave e, uma vez e, Espanha, deram-lhe um tratamento de favor, anulando a condenação cubana e pondo-o em liberdade. Mas, e isto é doloroso, o Estado espanhol tem com o português “acordos espaciais” que lhe permitem, se assim o deseja, que a extradição seja rapidíssima; em Janeiro de 2014 fui traladado a Badajoz por ordem da polícia espanhola sem que nenhuma autoridade portuguesa tivesse sido ouvida e sem que se seguisse nenhum tipo de protocolo legal.

ESTOU FARTO DE TANTA INJUSTIÇA LEGAL POR PARTE DO ESTADO ESPANHOL e das suas duas (ou centenas) de varas de medir. Toda esta situação tem como motivo o ódio animal, irracional, visceral que me têm estes fascistas sem retorno do Partido Popular e do P$OE pelo facto de ser anarquista. Como sabem, eu expropriei bancos, e com muita honra, mas também fui condenado num julgamento-farsa em Navarra pela morte de dois Guardas Civis, acusação de que estou inocente. Ainda hoje luto para demonstrar a minha inocência neste caso, mas é-me muito difícil por estar já há quase 8 anos em total e absoluto isolamento.

Alguns/as de vocês talvez tenham lido o meu livro autobiográfico, publicado pela Editorial Txalaparta (www.txalaparta.com) intitulado “Me llaman El Solitario. Autobiografía de un expropiador de bancos”. Quero dizer-vos que tenho a intenção de escrever a continuação desse meu primeiro livro, que abarcará os anos de 2009 a 2016. Farei isso em Espanha, pois o que tenho a dizer é tão explosivo que em Portugal abrir-me-iam, com toda a certeza, processos judiciais que inviabilizariam o meu regresso a Espanha.

O objectivo desta carta à opinião pública é, antes de tudo, informar daquilo que se está a passar comigo neste momento e pedir-vos que mandem cartas, emails, … dirigidos ao Ministro da Justiça Rafael Catalá, ao Gabinete de Cooperação Jurídica Internacional do Ministério da Justiça (Oficina de Cooperación Jurídica Internacional de Ministerio de Justicia), à sua Directora-Geral, nos termos, corteses ou não, que vos pareçam bem, pedindo o meu regresso definitivo a Espanha. Agradeço-vos desde já.

E por último, informo-vos que eu, sendo acrata como sou, só votei uma vez na vida (deveria ter feito uma foto para recordação) e no foi no referendo em que se decidia se Espanha devia ou não entrar na NATO. O meu voto, claro, foi Não. Agora, nestes momentos históricos, voltaria a fazê-lo, para votar num movimento saído do 15 de Março de 2011, de maneira a varrer de uma vez por todas esta casta de parasitas, ladrõezecos e liberticidas que se apoderaram deste conjunto de nações que hoje ainda integram este país chamado Espanha.

Eu, como sabeis, desejo a abolição do estado e tenho levado toda a vida a lutar por esse objectivo como tenho podido. Mas não sou um ingénuo e sei que isto não vai ser possível dum momento para o outro, principalmente porque não estamos preparados para isso como sociedade livre. Mas acredito que podemos ir tornando o Estado cada vez mais pequeno e esvaziá-lo progressivamente de meios, tanto quanto nos consigamos organizar melhor. Para isso é fundamental apropriarmo-nos da economia e dos meios de produção, pois estes são a base do poder (bem entendido) popular. Não se deve pedir autorização ao Estado para desenvolver uma economia produtiva, nem questionarmo-nos se algo é lícito ou ilícito quando se trata de conseguirmos um objectivo tão nobre como a independência económica, a liberdade pessoal e a justiça popular e social. Podem estar de acordo comigo ou não. Mas o que é certo é que as coisas devem mudar para melhor. Não crêem nisso?

Um forte abraço libertário para todos e todas.

SAÚDE!

Jaime Giménez Arbe

Lisboa, 12 de Fevereiro de 2015″

aqui: http://www.alasbarricadas.org/noticias/node/34256

Retirado daqui: https://colectivolibertarioevora.wordpress.com/2015/04/27/el-solitario-situacao-de-um-preso-anarquista-em-portugal/