A Cimeira da NATO, realizada nos dias 19 e 20 de Novembro em Lisboa, poucos dias antes da Greve Geral de 24 de Novembro, foi objecto de um conjunto de acções e manifestações de protesto, contra os quais foi mobilizado um conjunto inédito de meios policiais. A contestação contra a NATO e a guerra ficou claramente marcada pela divisão entre o protesto “autorizado” e “não autorizado” e pela separação preventiva entre meios de protesto ditos “violentos” e “não-violentos”.
Para além do conjunto de acções e pequenas manifestações que decorreram sobretudo entre o dia 18 e o dia 21, destacamos dois protestos que tiveram lugar no dia 20.
Um destes protestos foi a acção levada a cabo na manhã de dia 20 nas imediações do Parque das Nações, na qual várias dezenas de activistas bloquearam durante algum tempo, com os próprios corpos, uma das vias de acesso ao local de realização da cimeira. Em resultado desta acção foram detidas 42 pessoas, que foram levadas para o tribunal de alta-segurança de Monsanto, situado num local isolado e afastado do centro de Lisboa, onde permaneceram largas horas sem direito a falarem com um advogado.
Outro protesto, que destacamos, foi a manifestação realizada durante a tarde na Avenida da Liberdade, no centro de Lisboa, na qual terão participado cerca de 30 mil pessoas. Esta manifestação, “autorizada”, foi convocada pela plataforma “Paz Sim, NATO Não”, composta por cerca de 100 organizações com predominância do Partido Comunista Português e de sindicatos da CGTP (Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses). Para o mesmo local e hora foi lançada uma convocatória da Plataforma Anti-Guerra Anti-NATO (PAGAN), responsável pela organização, entre outras iniciativas, de uma contra-cimeira no Liceu Camões. As cerca de 500 pessoas que acudiram a esta convocatória, “não autorizada”, foram tratadas pelas autoridades e pelo serviço de ordem da manifestação “autorizada” como um perigo público, isoladas do resto da manifestação e cercadas por três linhas de polícias do Corpo de Intervenção, que impediram, ao longo do percurso, que qualquer pessoa entrasse ou saísse do quadrado a que estavam confinadas.
A repressão sobre as acções realizadas neste dia foi o culminar de uma estratégia repressiva desenvolvida pelas autoridades e implementada com meses de antecedência para prevenir o protesto autónomo e “não autorizado”. Um aspecto essencial da estratégia policial para dissuasão do protesto consistiu na desinformação dirigida à população em geral e às várias forças que se vinham mobilizando para a organização de protestos contra a NATO.
Por um lado, pretendeu-se criar um ambiente propício à legitimação dos tremendos gastos em meios de repressão. A ampliação sensacionalista da ameaça de protestos violentos começou a ser propagada com meses de antecedência (iniciando-se com a manchete na capa do Diário de Notícias de 5 de Junho: “Cimeira da NATO em Lisboa alvo da Al-Qaeda e de anarquistas”). A quantidade de notícias falsas foi aumentando à medida que se aproximavam as datas da Cimeira, abrangendo praticamente todos os órgãos de comunicação social. Chegou a altura em que, para dar mais credibilidade e sensacionalismo à ameaça de distúrbios durante a cimeira, não bastavam já os “anarquistas residentes”, e foi necessário criar o mito de que hordas estrangeiras de desordeiros violentos, anarquistas do “black bloc”, se preparavam para acudir aos milhares a Lisboa com o objectivo de não deixar pedra sobre pedra. Não deixa de ser importante constatar que, se é certo que parte das notícias se deveram certamente à imaginação jornalística e à repetição acrítica das mentiras veiculadas, a existência de fontes policiais raramente foi referida, não havendo, com a excepção do presidente do OSCOT (Observatório da Segurança, Criminalidade Organizada e Terrorismo) José Manuel Anes, quem assumisse a responsabilidade pelas informações.
Por outro lado, pretendeu-se provocar a divisão entre os contestatários à cimeira da NATO, através da separação entre manifestantes “pacíficos” e “violentos”. E também aqui as autoridades foram bem sucedidas. A plataforma “Paz Sim, NATO Não”, que convocou a manifestação realizada no centro de Lisboa, ao longo da Avenida da Liberdade, veio a assumir claramente esta distinção, aproveitando-se mesmo dela para evitar perder o protagonismo no protesto contra a NATO. No início da manifestação, no Marquês de Pombal, o serviço de ordem da manifestação colaborou com o Corpo de Intervenção na tarefa de apontar e isolar os elementos não desejados na manifestação, entre os quais a PAGAN e os anarquistas, mas também muitas outras pessoas que desejavam integrar um bloco autónomo nesta manifestação.
Mas é importante salientar que a própria PAGAN, que pretendia representar uma alternativa apartidária de protesto anti-militarista, não se isentou deste perigo de divisão vindo mesmo a morder o isco lançado pelas autoridades e pelos media. Em sucessivos comunicados e declarações aos media, antes e durante os protestos contra a Cimeira da NATO, a PAGAN e alguns dos seus membros, esforçaram-se por veicular a mensagem de que apenas realizariam protestos “pacíficos”, chegando mesmo a afirmar que pretendiam “demonstrar que é possível protestar através de meios pacíficos”. Aceitando a falsa distinção entre métodos “violentos” e “não violentos” de protesto, estes activistas acabaram por contribuir, também eles, para legitimar o monopólio estatal da violência e toda a repressão preventiva que que se abateu sobre o protesto não enquadrado políticamente, uma repressão que, apesar de inédita, poderia ter assumido contornos bem mais violentos. Em vésperas de greve geral, em nada se contribuiu, com estas declarações, para desmascarar a hipocrisia dos mercenários do Estado, que sob a capa da lei e da ordem pública estão sempre prontos a derramar sangue, bem presente nas palavras de Magina da Silva, chefe da Unidade Especial de Polícia, que, quando questionado por jornalistas sobre se a polícia estaria disposta a utilizar a violência contra os manifestantes, replicou que “não se pode falar de violência quando se trata da actuação da polícia, pois a polícia limita-se a utilizar a força pública para repor a ordem”.
Para além do conjunto de acções e pequenas manifestações que decorreram sobretudo entre o dia 18 e o dia 21, destacamos dois protestos que tiveram lugar no dia 20.
Um destes protestos foi a acção levada a cabo na manhã de dia 20 nas imediações do Parque das Nações, na qual várias dezenas de activistas bloquearam durante algum tempo, com os próprios corpos, uma das vias de acesso ao local de realização da cimeira. Em resultado desta acção foram detidas 42 pessoas, que foram levadas para o tribunal de alta-segurança de Monsanto, situado num local isolado e afastado do centro de Lisboa, onde permaneceram largas horas sem direito a falarem com um advogado.
Outro protesto, que destacamos, foi a manifestação realizada durante a tarde na Avenida da Liberdade, no centro de Lisboa, na qual terão participado cerca de 30 mil pessoas. Esta manifestação, “autorizada”, foi convocada pela plataforma “Paz Sim, NATO Não”, composta por cerca de 100 organizações com predominância do Partido Comunista Português e de sindicatos da CGTP (Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses). Para o mesmo local e hora foi lançada uma convocatória da Plataforma Anti-Guerra Anti-NATO (PAGAN), responsável pela organização, entre outras iniciativas, de uma contra-cimeira no Liceu Camões. As cerca de 500 pessoas que acudiram a esta convocatória, “não autorizada”, foram tratadas pelas autoridades e pelo serviço de ordem da manifestação “autorizada” como um perigo público, isoladas do resto da manifestação e cercadas por três linhas de polícias do Corpo de Intervenção, que impediram, ao longo do percurso, que qualquer pessoa entrasse ou saísse do quadrado a que estavam confinadas.
A repressão sobre as acções realizadas neste dia foi o culminar de uma estratégia repressiva desenvolvida pelas autoridades e implementada com meses de antecedência para prevenir o protesto autónomo e “não autorizado”. Um aspecto essencial da estratégia policial para dissuasão do protesto consistiu na desinformação dirigida à população em geral e às várias forças que se vinham mobilizando para a organização de protestos contra a NATO.
Por um lado, pretendeu-se criar um ambiente propício à legitimação dos tremendos gastos em meios de repressão. A ampliação sensacionalista da ameaça de protestos violentos começou a ser propagada com meses de antecedência (iniciando-se com a manchete na capa do Diário de Notícias de 5 de Junho: “Cimeira da NATO em Lisboa alvo da Al-Qaeda e de anarquistas”). A quantidade de notícias falsas foi aumentando à medida que se aproximavam as datas da Cimeira, abrangendo praticamente todos os órgãos de comunicação social. Chegou a altura em que, para dar mais credibilidade e sensacionalismo à ameaça de distúrbios durante a cimeira, não bastavam já os “anarquistas residentes”, e foi necessário criar o mito de que hordas estrangeiras de desordeiros violentos, anarquistas do “black bloc”, se preparavam para acudir aos milhares a Lisboa com o objectivo de não deixar pedra sobre pedra. Não deixa de ser importante constatar que, se é certo que parte das notícias se deveram certamente à imaginação jornalística e à repetição acrítica das mentiras veiculadas, a existência de fontes policiais raramente foi referida, não havendo, com a excepção do presidente do OSCOT (Observatório da Segurança, Criminalidade Organizada e Terrorismo) José Manuel Anes, quem assumisse a responsabilidade pelas informações.
Por outro lado, pretendeu-se provocar a divisão entre os contestatários à cimeira da NATO, através da separação entre manifestantes “pacíficos” e “violentos”. E também aqui as autoridades foram bem sucedidas. A plataforma “Paz Sim, NATO Não”, que convocou a manifestação realizada no centro de Lisboa, ao longo da Avenida da Liberdade, veio a assumir claramente esta distinção, aproveitando-se mesmo dela para evitar perder o protagonismo no protesto contra a NATO. No início da manifestação, no Marquês de Pombal, o serviço de ordem da manifestação colaborou com o Corpo de Intervenção na tarefa de apontar e isolar os elementos não desejados na manifestação, entre os quais a PAGAN e os anarquistas, mas também muitas outras pessoas que desejavam integrar um bloco autónomo nesta manifestação.
Mas é importante salientar que a própria PAGAN, que pretendia representar uma alternativa apartidária de protesto anti-militarista, não se isentou deste perigo de divisão vindo mesmo a morder o isco lançado pelas autoridades e pelos media. Em sucessivos comunicados e declarações aos media, antes e durante os protestos contra a Cimeira da NATO, a PAGAN e alguns dos seus membros, esforçaram-se por veicular a mensagem de que apenas realizariam protestos “pacíficos”, chegando mesmo a afirmar que pretendiam “demonstrar que é possível protestar através de meios pacíficos”. Aceitando a falsa distinção entre métodos “violentos” e “não violentos” de protesto, estes activistas acabaram por contribuir, também eles, para legitimar o monopólio estatal da violência e toda a repressão preventiva que que se abateu sobre o protesto não enquadrado políticamente, uma repressão que, apesar de inédita, poderia ter assumido contornos bem mais violentos. Em vésperas de greve geral, em nada se contribuiu, com estas declarações, para desmascarar a hipocrisia dos mercenários do Estado, que sob a capa da lei e da ordem pública estão sempre prontos a derramar sangue, bem presente nas palavras de Magina da Silva, chefe da Unidade Especial de Polícia, que, quando questionado por jornalistas sobre se a polícia estaria disposta a utilizar a violência contra os manifestantes, replicou que “não se pode falar de violência quando se trata da actuação da polícia, pois a polícia limita-se a utilizar a força pública para repor a ordem”.
AIT-Secção Portuguesa / Núcleo de Lisboa